Unha das miñas cancións favoritas, da autoría do grande Chico Buarque:
Poño aquí a letra; porén, se aínda non a ouvistes nunca, recoméndovos que lle deades ao play e ouzades a canción cos ollos fechados.
Geni e o Zepelim
De tudo que é nego torto,
do mangue e do cais do porto,
ela já foi namorada.
O seu corpo é dos errantes
dos cegos, dos retirantes.
É de quem não tem mais nada.
Dá-se assim desde menina,
na garagem, na cantina,
atrás do tanque, no mato.
É a rainha dos detentos,
das loucas, dos lazarentos,
dos moleques do internato
E também vai amiúde
c'os velhinhos sem saúde
e as viúvas sem porvir.
Ela é um poço de bondade
e é por isso que a cidade
vive sempre a repetir:
- Joga pedra na Geni!
- Joga pedra na Geni!
- Ela é feita pra apanhar!
- Ela é boa de cuspir!
- Ela dá pra qualquer um!
- Maldita Geni!
Um dia surgiu, brilhante,
entre as nuvens, flutuante,
mm enorme zepelim.
Pairou sobre os edifícios,
abriu dois mil orifícios
com dois mil canhões, assim.
A cidade apavorada
se quedou paralisada
pronta pra virar geléia.
Mas do zepelim gigante
desceu o seu comandante
dizendo - Mudei de idéia.
- Quando vi nesta cidade
Tanto horror e iniqüidade
resolvi tudo explodir.
Mas posso evitar o drama
se aquela formosa dama
esta noite me servir
- Essa dama era Geni!
- Mas não pode ser Geni!
- Ela é feita pra apanhar!
- Ela é boa de cuspir!
- Ela dá pra qualquer um!
- Maldita Geni!
Mas de fato, logo ela
tão coitada e tão singela
cativara o forasteiro.
O guerreiro tão vistoso
tão temido e poderoso
era dela, prisioneiro.
Acontece que a donzela
(e isso era segredo dela)
também tinha seus caprichos.
E a deitar com homem tão nobre,
tão cheirando a brilho e a cobre
preferia amar com os bichos.
Ao ouvir tal heresia
a cidade em romaria
foi beijar a sua mão
O prefeito de joelhos,
o bispo de olhos vermelhos
e o banqueiro com um milhão.
- Vai com ele, vai, Geni!
- Vai com ele, vai, Geni!
- Você pode nos salvar!
- Você vai nos redimir!
- Você dá pra qualquer um!
- Bendita Geni!
Foram tantos os pedidos,
tão sinceros, tão sentidos,
que ela dominou seu asco.
Nessa noite lancinante
entregou-se a tal amante
como quem dá-se ao carrasco.
Ele fez tanta sujeira,
lambuzou-se a noite inteira
até ficar saciado.
E nem bem amanhecia
partiu numa nuvem fria
com seu zepelim prateado.
Num suspiro aliviado,
ela se virou de lado
e tentou até sorrir.
Mas logo raiou o dia
e a cidade em cantoria
não deixou ela dormir.
- Joga pedra na Geni!
- Joga pedra na Geni!
- Ela é feita pra apanhar!
- Ela é boa de cuspir!
- Ela dá pra qualquer um!
- Maldita Geni!
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